Parte dos Cadernos de Residência Pedagógica, obra trata do ensino de ciências nos anos iniciais da educação básica
Organizado por Adriana Braga, Emerson Santos e Rui Vieira, livro Ciências da Natureza faz parte dos Cadernos de Residência Pedagógica e trata do ensino de ciências nos anos iniciais da educação básica no Brasil como desenvolvimento do pensamento crítico.
Leia a Introdução do livro abaixo. O download do livro completo pode ser feito aqui.
Vivemos em uma sociedade moldada pelo conhecimento científico e tecnológico. As grandes cidades e suas populações somente podem existir com a condição de produzirmos e distribuirmos alimentos em grande quantidade para as pessoas; com capacidade de controlarmos doenças, identificando-as e desenvolvendo medicamentos para combatê-las; pela condição de saneamento básico com o tratamento de água e esgotos; com a presença da energia elétrica e os inúmeros equipamentos que vão desde uma simples lâmpada, até satélites que viabilizam a comunicação o controle de equipamentos a distância, dentre outras coisas. Essa lista está longe de exaurir os exemplos de como a ciência e tecnologia não podem ser dissociadas de nossa sociedade. No entanto, alguns desses itens nos permitem verificar a importância de garantirmos que temas das ciências da natureza estejam presentes nos anos iniciais da vida escolar das crianças. Se tomarmos como exemplo a produção de alimentos em larga escala, verificamos que isso remete a diversas questões de cunho sociocientífico como: o uso de fertilizantes, agrotóxicos, transgênicos, radiação, entre outros. Essas técnicas de produção têm sido alvo de inúmeros debates sobre sua viabilidade e segurança para a saúde das pessoas e sobre o impacto ambiental. Nesse sentido, quais instrumentos possuímos para avaliar o melhor alimento a ser consumido por nós e nossas crianças? Quando vamos ao mercado nos preocupamos com isso? Em que lugar podemos identificar as informações da procedência dos alimentos? Alimentos transgênicos podem ser prejudiciais à saúde? Existe alguma alternativa para a produção em massa sem o uso dessas técnicas?
Provavelmente, não temos respostas a todas essas questões. Mas, somente podemos entender seu contexto, fazer escolhas conscientes e opinar se tivermos acesso ao conhecimento científico e tecnológico que envolve essa temática e desenvolvermos capacidades para entendê-lo. Vigotski (2001), um dos mais importantes pesquisadores do desenvolvimento cognitivo, argumenta que quanto mais cedo as crianças têm acesso ao conhecimento científico mais cedo adquirem a estrutura cognitiva para entendê-lo. O pesquisador destaca que nesse processo deve-se respeitar o que chamou de Zona de Desenvolvimento Imediato, que significa que só é produtivo estudar conhecimentos científicos que a criança seja capaz de aprender com a ajuda de um parceiro mais capaz, que pode ser o professor, os familiares ou até mesmo outros colegas. Dessa forma é de extrema importância conhecer como ocorre o desenvolvimento cognitivo das crianças e as possíveis estratégias para abordar temas científicos.
O ensino de ciências nos anos iniciais da educação básica, aqui abordado, não visa a memorização de conceitos a partir de uma perspectiva conteudista, mas o desenvolvimento do pensamento crítico por meio da abordagem de conteúdos de ciências, o que possibilita condições para que as crianças desenvolvam uma postura crítica em relação aos conhecimentos científicos e tecnológicos, relacionando-os aos comportamentos da sociedade diante da natureza.
As crianças trazem para a escola conhecimentos adquiridos em ambientes extraescolares desde muito pequenas. Estão constantemente expostas a múltiplas fontes de informações em diferentes contextos e esses conhecimentos prévios não podem ser ignorados na escola. É papel do professor ampliar a experiência das crianças, oferecendo oportunidades na escola que extrapolam àquelas cotidianas. Os espaços que temos disponíveis podem oferecer contribuições diferentes à educação das crianças a partir da maneira como os utilizamos, como os organizamos. Os mesmos espaços, os mesmos materiais podem ser resignificados, tendo em vista a aprendizagem por meio de vivências, de trocas de experiências, da interação com o outro. O modo como o professor conduz as atividades também deve ser considerado, pensando que além dos conhecimentos e saberes que desejamos abordar, devemos ter clareza sobre como abordá-los. Os conteúdos a serem ensinados não devem ser tratados como tendo finalidade em si mesmo, mas como um meio para uma formação integral. A importância de aproximar as crianças de saberes que extrapolem o senso comum e estejam embasados em conhecimentos científicos, assim como de incentivá-las a observar, questionar e criar hipóteses sobre os fenômenos da natureza presentes na nossa vida, é ressaltada no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil:
É importante que as crianças tenham contato com diferentes elementos, fenômenos e acontecimentos do mundo, sejam instigadas por questões significativas para observá-los e explicá-los e tenham acesso a modos variados de compreendê-los e representá-los. […]
O trabalho com com este eixo, portanto, deve propiciar experiências que possibilitem uma aproximação ao conhecimento das diversas formas de representação e explicação do mundo social e natural para que as crianças possam estabelecer progressivamente a diferenciação que existe entre mitos, lendas, explicações provenientes do ‘senso comum’ e conhecimentos científicos. (BRASIL, 1998, pág. 167).
Com base nessa concepção de Educação Infantil, o ensino de ciências naturais nessa etapa visa incentivar a curiosidade e observação das crianças sobre a natureza, promover o questionamento de fenômenos observáveis e possibilitar a criação e expressão de hipóteses e explicações para eles. Dessa maneira, educando para a formação de uma visão crítica sobre o mundo.
A compreensão de que há uma relação entre os fenômenos naturais e a vida humana, é um importante aprendizado para a criança. A partir de questionamentos sobre tais fenômenos, as crianças podem refletir a respeito do funcionamento da natureza, seus ciclos e ritmos do tempo, e sobre a relação que o homem estabelece com ela. Isso tudo, possibilita, entre outras coisas, ampliar seus conhecimentos, rever e reformular as explicações que possuem sobre.
Nesse caderno procuramos discutir como os educadores podem desenvolver ações que priorizem a criação e imaginação das crianças por meio de atividades lúdicas com temas de ciências naturais. O caderno está organizado em quatro capítulos e iniciamos nossa jornada apresentando como os conceitos de imaginação e criação na infância são entendidos por Vigotski e como o autor defende sua importância no desenvolvimento das crianças. No segundo capítulo discutimos sobre a importância e a possibilidade do uso de materiais acessíveis e do cotidiano do aluno para o desenvolvimento de atividades lúdicas. No quarto terceiro apresentamos alguns exemplos de atividades realizadas com crianças e discutimos os resultados que encontramos em sua aplicação de acordo com a teoria sociohistórica de Vigotski. No quarto capítulo encerramos o caderno realizando uma reflexão sobre como a importância de estabelecer ações de educação ambiental para a sustentabilidade nas escolas.